Alexandre Porto
ALVARÁ DE CRIAÇÃO DA VILA EM 1819



Alvará com força de Lei pelo qual se erige em Villa o Sitio e Povoação de São Domingos da Praia Grande; na forma que abaixo se declara:

A primeira Câmara Municipal de Nictheroy (1819), como as primitivas do Brasil, regeu-se pelos quarenta e nove parágrafos do L. i'tit 66 e outros, da Ordenações do Reino ou Philippinas, publicadas em 1604.

Elas fixaram as atribuições gerais dos municípios, os deveres dos vereadores, estabeleceram um sistema para eleição dos oficiais da Câmara, etc. Leis posteriores conferiram-lhe outras atribuições.

Com relação à nomeação dos empregados competia-lhe nomear os Juízes Almotacés, os recebedores de Sisas, os depositários públicos, os alcaides, os capitães-mores das ordenanças, (sendo a Câmara presidida pelo corregedor ou provedor da Câmara) os sargentos-mores (as presididas pelos capitães-mores), os capitães do mato, os juízes da vintena, tesoureiros, etc.

Exerciam ainda funções judiciais em causas de injúrias verbais, assim como policiais, todavia só podiam despender duas partes das suas rendas.

Compunha-se de um juiz, seu presidente nato e três vereadores, um escrivão, um procurador e um tesoureiro, a que chamavam Oficiais da Câmara. Estes eram eleitos sob a presidência dos corregedores, ou ouvidores ou Juízes de Fora do seguinte modo: o povo votava em seis homens para eleitores e estes seis apresentavam um rol, contendo os nomes dos que queriam eleger para juízes, vereadores, escrivães, etc, que deviam servir por três anos.

Gozavam os oficiais da Câmara de certas imunidades, pois não podiam ser presos, processados, suspensos sem ordem do rei.

Até então os habitantes da aldeia de São Lourenço não tinham gozado diretamente destes privilégios locais, pois que o território por eles povoados dependia da administração municipal da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro da qual era um termo.

Desde, porém, de 13 de Maio de 1816 (depois da visita do d. João VI e família às nossas plagas), falava-se e esperava-se o desmembramento do arraial da direção da cidade de São Sebastião. E assim foi que, três anos depois desta visita perpetuada ainda hoje na face oriental da coluna ereta no Largo da Memória com as seguintes palavras, 13 de Maio de 1816, o augusto rei baixou o seguinte alvará da criação da Villa Real da Praia grande: (A)

Eu El-Rey Faço saber aos que este Alvará com força de Lei virem: Que sendo-Me presente em Consulta da Mesa do Meu Desembargo do Paço a necessidade que ha de se crear huma Villa no Sitio e Povoação de São Domingos da Praia Grande do Termo desta Cidade, para melhor e mais prompta administração da Justiça, afim dos moradores da ditta Povoação, como das quatro Freguesias visinhas de São João de Icarahi, de São Sebastião de Itaipú, de São Lourenço dos Indios, e de São Gonçalo, avista dos grandes embaraços, que todos elles experimentão no largo trajecto do mar entre aquella Praia, e esta Cidade, que são obrigados a passar frequentemente para promoverem nella os seus recursos, litigios e dependencias; tendo aliás crescido muito a sua população, que excede já a mais de treze mil habitantes na sua total extensão, e que diariamente vai crescendo cada vez mais pelas vantagens, que offerece a sua situação proxima a esta Capital e ao seu Porto: Ponderando-se mais na ditta Consulta a circumstancia de ter sido especialmente honrado o dito Sitio e Povoação com a Minha Augusta Presença, e da Minha Real Família no Fausto Dia 13 de Maio de 1816, concorrendo ali a Corte formalmente e os Tribunaes, e estando tambem alli acampada a Divisão das Minhas Tropas ora denominadas "dos Voluntarios Reaes d'El Rey" a quem Fui então Servido Agraciar com especiaes demonstrações de Minha Real Benevolencia: de maneira que até por este plausivel motivo, e para se perpetuar a memoria daquelle a muitos respeitos Solemne Dia, era mui proprio da Minha Soberania elevar o sobredito Sitio e Povoação á classe e diguinidade de Villa: Propondo-se finalmente na referida Consulta que por todos estes motivos Houvesse Eu por bem Crear não só a dita Villa, mas hum lugar de Juiz de Fóra do Civel, Crime e Orfãos para ella, o qual exercitasse tambem a sua jurisdição na Villa de Santa Maria de Maricá e seu Termo, que hé confinante, e fica na distancia de seis e sete legoas, segundo as diversas estradas, que para ella se dirigem: tudo ao fim de se facilitarem aos Povos de huma e outra Villa os meios da mais prompta e segura administração da Justiça por hum Magistrado Letrado, e de maior confiança.

E tendo Consideração ao referido e do mais que se surpreendeu na mencionada Consulta, em que foi ouvido o Procurador da Minha Corôa e Fazenda, com o Parecer do qual Houve por bem Conformar-Me. Sou Servido Erigir em Villa o sobredito Sitio e Povoação de São Domingos da Praia Grande com a de nominação de "Villa Real da Praia Grande" - a qual terá por Termo as quatro Freguezias visinhas de São João de Icarahy, de S. Sebastião de Itaipú, de São Lourenço dos Indios, e de S. Gonçalo, que ficarão desde logo desmembradas do Termo desta Cidade a que pertencião: e gosará de todas as Prerrogativas, Privilegios de que gosarem as demais Villas de Meus Reinos: e os moradores della e do seu Termo serão obrigados a apromptar á sua custa o Pelourinho, Casa da Camara, Cadêa e mais officinas debaixo das Ordens da Mesa do Meu Dezembargo do Paço. (B)

A Camara da ditta Villa nova se comporá na forma da lei do Reino de trez Vereadores, hum Procurador do Conselho, que Hei por bem Crear para ella, assim como a dous Almoraceis, dous Tabeliães do Publico, Judicial e Notas, hum Alcaide, e o Escrivão do Dezembargo; ficando annexo ao Officio de primeiro Tabelião os d'Escrivão da Camara, Almotaçaria e Sizas, e ao segundo Tabelião o d'Escrivão dos Orfãos: E as pessoas que forem providas nos ditos Empregos os servirão na forma das Leis e Regimentos que lhe são respectivos.

Á mesma Camara ficarão pertencendo todos rendimentos estabelecidos no mencionado Sitio e Povoação, e nas quatro Freguezias acima declaradas, que até agora percebia o Senado da Camara desta Cidade; além d'huma Sesmaria d'huma legoa de terra em quadro, conjuncto ou separadamente, aonde a houver desembaraçada, a qual lhe será concedida pela Mesa do Meu Desembargo do Paço para se afforar em pequenas porções com foros rasoaveis e o Laudemio da Ordenação do Reino, procedendo-se a respeito de taes aforamentos na conformidade da Lei de 23 de Julho de 1766.

Sou outrosim Servido crear para dita nova Villa hum Lugar de Juiz de Fóra do Civel, Crime e Orfãos, e annexar a referida Villa de Santa Maria de Maricá e seu Termo á jurisdição do Mesmo Juiz de Fóra; o qual vencerá o ordenado, próes e precalços, que directamente lhe competirem e servirá com os mesmos Escrivães e Officiaes, com que actualmente servem os Juizes Ordinarios, e dos Orfãos da dita Villa de Santa Maria de Maricá, cujos Lugares ficarão supprimidos desde o dia da posse daquelle Ministro; subsistindo unicamente os Vereadores e Procurador do Concelho na forma que se observa nas outras Villas aonde ha Juizes de Fóra.

Pelo que Mando a Mesa do Meu Desembgado do Paço e da Conciencia e Ordens, Presidente do Meu Real Erario, Conselho da Minha Real Fazenda, Regedor da Casa da Supplicação, e a todos os Tribunaes, Ministros de Justiça, e quaesquer outras pessoas a quem o conhecimento, e execução do presente Alvará haja de pertencer o cumprão e guardem, e fação cumprir e guardarm, tão inteiramente como n'elle se contém, não obstante quaesquer Leis, Alvarás, Requerimentos, Decretos, ou Ordens que o contrario determinem; porque todos e todas Hei por derogados, como dellas e delles Fizesse expressa e individual menção para o referido effeito somente; ficando aliás sempre em seu vigor e observancia e valerá como Carta passada pela Chancelaria, posto que por ella não ha de passar e seu effeito haja de durar mais d'hum anno, sem embargo da Ordenação em comtrario.

Dado no Rio de Janeiro a dez de Maio de 1819 - El Rey com Guarda. Alvará com força de Lei, pelo qual Vossa Magestade Ha por bem Erigir em Villa o Sitio e Povoação de S. Domingos da Praia Grande do Termo desta Cidade com a denominação de - Villa Real da Praia Grande - Designando o Termo, Rendimentos, e patrimonio que lhe hão de pertencer. E Ha outrosim por bem Crear para a mesma Villa hum Lugar de Juiz de Fóra do Civel, Crime e Orfãos; annexando á sua jurisdicção a Villa de Santa Maria de Maricá, e seu Termo, que lhe hé confinante, tudo na forma que acima se expressa e declara. Para S. Magestade ver.

Por immediata Resolução de Sua Magestade de 12 de Fevereiro de 1819 tomada em Consulta da Meza do Desembargo do Paço de 8 do mesmo mez e anno - Monsenhor Almeida, José d'Oliveira Pinto Botelho e Mosquêra - Bernardo José de Souza Lobato o fez escrever. Joaquim José da Silveira o fez.

Registrado a folha 74 do livro segundo que serve de Registro de Decretos Alvarda n'esta Secretaria da Meza de Dezembargo do Paço do Reino do Brazil.

Rio de Janeiro nove de Junho de mil oitocentos e dezenove. Henrique Anast. cio de Novaes. Na Impressão Regia. Está con forme. Manoel Fernandes Coelho.


(A) A 13 de Maio de 1816, S.A. o primeiro regente devia passar em revista solene aos briosos Voluntários d'El-Rei, prestes a embarcar para Montevideu. Escolheu-se a Praia Grande e para lá passaram S.A. e Ssus Augusta Família, a sus Corte, todas as autoridades civis e militares, os magistrados, o clero e as personalidades mais distintas da cidade de São Sebastião; sem contar os curiosos inumeráveis de todas as bandas. A Praia Grande mostrou-se digna da súbita honra, e a recompensa não se fez esperar. O lugar escolhido para esta visita foi o Campo de Dona Helena que foi sucessivamente conhecido por largo do Pelourinho, Rócio, e Memória. O Largo está hoje dividido em dois, pois outrora compreendia o que é hoje o do Capim ou Santo Alexandre, e Memória,

(B) Nota-se que o lugar primitivamente escolhido para a solenidade da ereção da Villa foi o Largo de São Domingos que, por estreito, deu motivo a se procurtar o Campo de Dona Helena.


Transcrito no original de artigo de Manoel Benício, ex-vereador e tabelião da cidade, em 1896, no jornal O Fluminense.
Pesquisa e Edição: Alexandre Porto



Publicado em 14/08/2013









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Com formação em Engenharia Florestal, eu, Alexandre Porto, já fui produtor orgânico de alimentos e apicultor, mas hoje ganho a vida como escriba (Enciclopaedia Britannica do Brasil, Fundação de Arte de Niterói). Há 20 anos me dedico a pesquisar a História de Niterói, minha cidade natal, do Vasco, meu incompreendido time de futebol, e da Música Popular Brasileira, minha cachaça. Por 15 anos mantive uma pioneira rádio online no Brasil, a "Radinha". Pra quem quiser me encontrar nas redes, seguem os links:
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