"Sabemos ter sido encommendado ao illustre pintor brazileiro, Antonio de Parreiras, daqui filho e aqui residente, a feitura do retrato do indio Ararigboia, fundador de Nictheroy, em ponto grande, para ser collocado no salão nobre da Camara Municipal." (O Seculo, 29 de julho de 1907)
Conforme noticiou a imprensa local, ficou resolvido encarregar a este nosso patrÃcio, a pintura do retrato de Arariboia. Estudado o assunto, que além do retrato de Arariboia, deve sintetizar a fundação de Nictheroy, Parreiras nos forneceu as seguintes indicações que muito devem interessar todos os que amam esta terra.
O quadro que vai ser pintado medirá 2m e 50 cent. de largo, por 3m, e 50 cent. de alto, medidas estas impostas pela importância do assunto, pela composição do quadro, e pela colocação dele na municipalidade, onde ficará no lance de parede fronteiro ao quadro "Prece", também de autoria de Parreiras.
A figura de Arariboia terá a grandeza natural e será vestida com os costumes usados na época da fundação de Nictheroy, costumes estes que serão feitos em Paris (1), pela mesma casa que fez aqueles que atualmente servem para Parreiras pintar o quadro encomendado pelo Estado do Pará (2).
Além da figura de Arariboia, o quadro terá muitas outras, de modo a sintetizar ele, bem claramente, a momento histórico que nele se quer perpetuar.
Executado o quadro, ficará, como já dissemos, a municipalidade como um documento de incontestável valor, que ao mesmo tempo renderá a Arariboia a justa homenagem que ele merece, homenagem esta que a mesma municipalidade tem prestado a outros, cujos serviços não se podem comparar à quele prestado pelo valoroso Ãndio tão ingratamente esquecido até agora.
O que é necessário é que essa homenagem não fique aquém do valor de Arariboia, e que esse quadro, seja feito de tal modo que domine no edifÃcio, sobre todos que lá existem.
"Não é fácil - disse-nos Parreiras -, o assunto que tenho que pintar, embora já habituado a procuras de documentos históricos em nossos arquivos, embora a muito natural curiosidade me dê para isso uma paciência bem pouco relativa ao meu temperamento, bem sei que terei de muito procurar para que o meu quadro não seja uma mentira.
O tipo de Arariboia, embora sendo ele de uma raça já bem conhecida por mim, e tenha pertencido a um meio também estudado por mim, não me virá facilmente ao papel e à tela, porquanto o seu caráter moral difere muito do Ãndio comum.
Espero com natural segurança, que me sairei bem e que ao firmar o meu quadro eu tenha a certeza de corresponder à confiança que em mim depositou o prefeito de Nictheroy. Para isto, porém, necessito de tempo, sem o qual o meu quadro poderia ficar sem a verdade extrema que deve ter uma tela de assunto histórico."
O Fluminense, 06 de agosto de 1906 - sem assinatura
"Será hoje assignado na Prefeitura Municipal, com o illustre pintor Antonio Parreiras, o contrato para confecção do retrato de Martin Affonso de Souza, o Ararigboia, fundador da cidade de Nictheroy." (O Seculo, 24 de agosto de 1907)
Notas:
1) Conforme veremos ao longo desta série, o pintor mudou de ideia no decorrer das pesquisas, e retratou Arariboia com os trajes selvagens.
2) Antonio Parreiras entregou em Belém, em 1907, o quadro 'Conquista do Amazonas'. Uma encomenda feita dois anos antes pelo governador do Pará, Augusto Montenegro. A obra representa o ato de Pedro Teixeira tomando conta das terras da Amazônia para a coroa de Portugal.
SÉRIE: ARARIBOIA DE PARREIRAS
01 - Introdução
02 - A Encomenda e as Primeiras ideias do pintor
03 - O Contrato
04 - A Cidade Dividida
05 - Fundamentos para a Composição, por Antonio Parreiras
06 - Carta Aberta ao Insigne Pintor Antonio Parreiras, por J. A. da Silva
07 - Petição pede ao prefeito que não aceite o quadro de Parreiras
08 - O Quadro segundo Manoel BenÃcio
09 - Surge Nictheroy, crÃtica de O Paiz
10 - O Quadro de Antonio Parreiras, por Rubens Barbosa
11 - Manoel BenÃcio responde a Rubens Barbosa
12 - Parreira responde aos crÃticos
Leia também:
Antonio Parreiras;
'A Morte de Estácio de Sá', de Antonio Parreiras;
"Panorama de Nictheroy", de Antonio Parreiras